Homens e Amizades

 

Homens e Amizade

 

Thabiti Anyabwile

Thaibiti Anyabwile –  é o pastor da Primeira Igreja Batista, nas Ilhas Grand Cayman. Ele possui bacharelado e mestrado em psicologia obtidos na North Carolina State University. Serviu como pastor assistente na Capitol Hill Baptist Church, em Washington D.C. Thabiti tem sido convidado como  preletor em diversas conferências e seminários nos Estados Unidos e em outros países, é autor de artigos teológicos e livros, um deles, "O que é um membro de Igreja Saudável?", está no prelo pela Editora Fiel. Ele e sua esposa, Kristie, têm três filhos.

Eu valorizo meus amigos, mas, talvez, não de modo tão profundo como eu deveria.

Acho que me rendo às tentações peculiares de muitos homens no que diz respeito à amizade. Tenho a tendência de “fazer amigos” e, em seguida, deixá-los para lá. Por exemplo, recebi um e-mail de um amigo com o qual trabalhei no ministério alguns anos atrás. Foi a primeira vez que conversamos em quase dois anos. No aspecto positivo, parecemos que recomeçamos exatamente onde havíamos parado. Mas, no aspecto negativo, falar uma vez a cada 18 meses não pode ser chamado de “valorizar” amizade.

Ora, não tenho dúvida de que, se chamasse meu amigo em uma situação de emergência, ele deixaria o que estivesse fazendo e me socorreria em qualquer dificuldade. Tenho certeza de que eu faria o mesmo por ele. Somos realmente amigos. Amamos um ao outro e nos preocupamos um com o outro. No entanto, não somos tão íntimos como deveríamos. Não temos uma amizade profunda. E, talvez o que é mais problemático, não tenho certeza de que tenho visto muitos modelos de amizade profunda entre homens.

Portanto, este artigo é uma exposição do que poderia ser esse tipo de amizade. Talvez esteja artigo tem mais a natureza de “por exemplo” do que de “como”, pois admito que minhas amizades profundas tendem a ser poucas. Contudo, essa é a razão por que louvo a Deus por sua Palavra, que nos dá sabedoria e direção.

Intimidade

Talvez o maior inibidor de amizades profundas, entre os homens, seja esta palavra assustadora: “intimidade”. Que homem não fica levemente retraído e desconcertado ante a menção dessa palavra – especialmente, quando o objeto da intimidade é outro homem? A palavra tem sido tão associada à feminilidade, que parece ser o oposto de masculinidade e virilidade.

Apesar disso, as Escrituras contêm abundantes exemplos de amizade profunda entre homens, sem qualquer indício da afeminação dos homens. Em outras palavras, o problema ligado à intimidade entre homens está em nossa mente, e não arraigado na realidade.

O exemplo mais poderoso de amizade profunda que evidencia esse tipo de intimidade não é a amizade entre Davi e Jônatas, e sim a amizade entre Deus e Moisés. Êxodo 33.11 relata esta impressionante avaliação do relacionamento de Deus com Moisés: “Falava o&Senhor&a Moisés face a face, como qualquer fala a seu amigo”. Essa descrição é poderosa porque a sua natureza “face a face” – a sua intimidade – está incorporada na palavra final da sentença: “amigo”. De algum modo, ainda que jamais pensemos nisso, sabemos que essa palavra tencionava sugerir o conceito de intimidade. Sabemos que “face a face, como um homem fala com o gerente do banco”, ou com o atendente da lanchonete, ou com o seu colega de trabalho não transmite a mesma força de significado. Quando nosso Senhor chamou seus discípulos de “amigos” (Jo 15.13-15), ele não desejava expressar a idéia de afeição e interesse íntimos?

Compartilhar

Como os homens cultivam a intimidade que leva a amizade profunda? Bem, talvez não exista qualquer atividade ou programa que inspire, imediatamente, a intimidade sem aquela outra atividade temida: o compartilhar. Aqui no Caribe, posso ouvir as vaias e os gritos de desprezo nos jogos de basquete. Não podemos assistir ao jogo e celebrar apenas com aplausos os pontos marcados pelo nosso time?

Estou com vocês, amigos. Sim, estou mesmo. Mas, das centenas de homens que tenho visto assistindo a jogos, das centenas de homens com os quais tenho jogado basquete, poucos deles integrariam a minha lista de amizades profundas. Certamente, esse tipo de convívio nos proporciona associações amplas, mas não tende a cultivar a lealdade e a profundidade necessárias para suportar o peso da verdadeira amizade.

A diferença entre os homens com os quais tenho jogado basquete e os que considero amigos está na quantidade das coisas que compartilhamos de nós mesmos. Os amigos compartilham aquilo que é significativo. Assumem o risco ousado de serem transparentes, compartilhando os fardos, as esperanças, as alegrias, os temores, os fracassos, os triunfos, os problemas e as soluções (Pv 17.17; 27.9; Ec 4.10). Quanto a isso, o nosso modelo não é outro senão o próprio Senhor Jesus. Quando ele chamou os seus discípulos de “amigos”, em João 15, a base daquela amizade era o que Jesus compartilhava com eles. “Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer” (Jo 15.15).

Muitos homens não compartilham amizades profundas porque o compartilhar os torna vulneráveis. O fato irônico é que eles anelam por amizades profundas, mas escolhem o caminho que os impede de tais amizades.

Piedade

Uma das coisas que me entristece, como pastor, é ouvir os cristãos dizerem que acham mais fácil ter amizade profundas com não-cristãos do que com os cristãos. Quando ouço isso, inquieto-me em vários níveis. Pergunto-me se tal pessoa é atraída à piedade ou ao mundanismo. Questiono se os membros da igreja estão deixando de amar. Preocupo-me com o fato de que o cerne da fé cristã – o amor a Cristo e aos irmãos e irmãs em Cristo – está sendo deteriorado. A piedade e as coisas de Deus não deveriam ser as coisas mais atraentes para o povo de Deus e, por isso mesmo, o fundamento mais seguro para amizades profundas e significativas?

Parece que Deus agiu assim na seleção de seus amigos. Por causa da fé de Abraão em Deus, Deus o chamou de seu amigo (Tg 2.23). Jesus chamou os discípulos de amigos porque eles ouviram e guardaram a Palavra de Deus: eles obedeceram a Cristo (Jo 15.9-14). A piedade talvez seja o ingrediente essencial para construir relacionamentos espirituais, profundos e duradouros entre os homens.

Sem a piedade, seremos tentados ao mundanismo, ao pecado e à hostilidade para com Deus. Provérbios adverte: “Não te associes com o iracundo, nem andes com o homem colérico, para que não aprendas as suas veredas e, assim, enlaces a tua alma” (Pv 22.24-25). O apóstolo João expressou outra advertência solene: “Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele; porque tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo” (1 Jo 2.15-16). Por essa razão, o Senhor ordenou aos israelitas matarem seus amigos achegados que os seduzem secretamente a adorar deuses falsos (Dt 13.6-10).

A amizade ou corrompe ou fortalece poderosamente a nossa adoração a Deus. Portanto, a piedade é essencial em nossas amizades profundas. Considere& atentamente esta declaração do salmista: “Companheiro sou de todos os que te temem e dos que guardam os teus preceitos” (Sl 119.63) e a sabedoria de Provérbios 12.26: “O justo serve de guia para o seu companheiro, mas o caminho dos perversos os faz errar”.

Conclusão

Quase tudo que escrevi até aqui pressupõe certa autocentralidade. Pressupõe que precisamos ter amigos para nós mesmos. No entanto, tudo que escrevi deve também nos instruir quanto ao tipo de pessoa, o tipo de amigos que devemos ser para os outros. Afinal de contas, a essência do amor cristão é o dar de si mesmo e não o possuir egoísta.

Algumas perguntas podem ser proveitosas e ajudar-nos a refletir enquanto buscamos ser e ter o tipo de amigos que vemos nas Escrituras.

• Esta pessoa é um amigo de Cristo (Tg 2.23)?

• Posso compartilhar coisas significativas com esta pessoa?

• A minha indisposição de compartilhar está ligada a uma deficiência de caráter em mim mesmo ou na outra pessoa (temor, desconfiança, etc.)?

• Estou sendo muito passivo em cultivar amizades significativas? Se estou, como posso mudar esse padrão de comportamento?

• Estou me tornando disponível aos outros homens para que tenhamos amizade piedosa?

A intimidade criada por compartilhar com amigos piedosos é o caminho para amizades profundas. E tais amizades são evidência de masculinidade, mas também são necessárias e sábias. Sem elas, somos mais vulneráveis do que pensamos. Falando com franqueza, a ausência de amizades profundas e de um cultivo ativo desses relacionamentos podem ser evidência de imaturidade e de covardia autoprotetora. Nenhum homem de Deus deve viver dessa maneira.
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Traduzido por: Wellington Ferreira

Copyright© Thabiti Anyabwile

Copyright© Editora FIEL 2009.

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